24 de setembro de 2009

Esperança na vida

De manhã cedo, as portas se abrem e aquele homem, que também mora ali, senta-se num sofá estrategicamente colocado na entrada. A casa recebe durante todo o dia crianças e adolescentes e, os primeiros a chegarem, são os mais pequenos. Às vezes um “bom dia”, às vezes só um olhar ou apenas a presença e a certeza de que é possível acreditar num bom dia.
Essa é a rotina da Casa Chico Mendes, uma entidade que existe no bairro Monte Cristo, em Florianópolis, que atua como reforço educacional e com atividades nas áreas da arte, cultura, direitos humanos, família, saúde e juventude. Os protagonistas, crianças, jovens, mulheres e famílias constroem, a cada novo dia, oportunidades e possibilidades, na esperança de que um mundo melhor e mais justo é possível.
Numa realidade de pobreza, exclusão, tráfico de drogas, prostituição, desrespeito à dignidade humana, a vida grita forte e cada vez mais intensamente, especialmente nas sutilezas e pequenas coisas. Esse grito é ouvido, mesmo quando abafado pelo som de tiros e choros.
São muitos os desafios, as necessidades, as “faltas” que pude observar, com meu limitado “olhar de fora”, durante aquela semana do ano de 2005 que morei por lá.. Embora não queira e nem possa esconder os problemas que lá percebi, quero apresentar a “outra comunidade” que poucos conhecem e que a mídia insiste em não mostrar, porque essa comunidade me ensinou a enxergar mais a vida e fizeram isso da melhor forma: simplesmente vivendo!
Cada gesto que presenciei, as histórias que escutei, os abraços, as lembranças que renasciam nas conversas, a labuta diária, cada olhar, cada aceno... tudo revelava uma bela oração e um sincero louvor ao Deus Criador.
Vejam só, o que mais queria era fazer alguma coisa. “Eu posso ajudar, participar, somar...” Visitei famílias, convivi com muitas pessoas, organizei atividades com crianças, caminhei pelas vielas e becos... preenchi meu tempo com um monte de tarefas e acabei fazendo pouco o mais importante: observar, contemplar.
Aquele homem, que abre todas as manhãs as portas, seu nome é Donizeti, ou Dodô, se preferir. Com ele conversei muito, contamos muitas histórias, ouvi muito as suas experiências. Aprendi muito com esse solitário que não passa um instante do dia sem alguém por perto, especialmente com seu olhar atento e coração aberto à vida, na simplicidade que ela tem. Naquele sofá, ele contempla o mundo. No silêncio... sem muitas palavras. Só permitindo que a vida se lhe apresente. E quando pode, não mede esforços para interagir com a vida.
Obrigado Dodô, por me ensinar a aprender com a vida.
Obrigado Fran, Doio, Fabrício, Carla, Sandra, Antônio, Natália, Santina e tantos outros, adultos e crianças, que caminharam comigo nesta semana e agora fazem parte da minha caminhada na vida.
Obrigado irmã Mari, irmã Luzia, irmã Maria. Por opção, mantém uma casa religiosa na comunidade. São moradoras do bairro e que lutam pela melhoria do lugar da qual fazem parte, realizando o Evangelho no cotidiano. Nossas orações se encontram todos os dias, com o cantar dos pássaros que nos acompanharam nos salmos matutinos.

Giorgio Sinestri

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