24 de junho de 2013

O gigante acordou...

 

Havia tempo que o Brasil não conhecia manifestações populares de protesto e insatisfação como aquelas que vimos nesses dias passados. Será que o “gigante pela própria natureza” resolveu levantar-se do “berço esplêndido” em que jazia “eternamente”?
 
As manifestações tiveram início em São Paulo, com o protesto de combater o aumento do bilhete do transporte coletivo urbano. Logo, estenderam-se para outras capitais do Brasil. A reivindicação pelo bilhete foi atendida, depois de alguns dias; mas as manifestações, inicialmente, sobretudo de estudantes, só foram aumentando em volume e extensão. E já não eram mais apenas jovens: também pessoas adultas, idosas e até crianças.
 
Os motivos do protesto, que quer ser político mas não partidário, passaram a ser os mais diversos: corrupção e desperdício no uso do dinheiro público, estádios suntuosos e interesses “esportivos” pouco transparentes em vez de hospitais, escolas, mais infra-estrutura de transportes urbanos; contra a politização da justiça e tantos outros motivos foram expressos em palavras de ordem de lideranças pouco identificáveis, ou cartazes improvisados nos cortejos dos manifestantes.
 
O que querem mesmo esses manifestantes, que enchem ruas, praças e rodovias, ameaçam tomar símbolos do poder, como os palácios do governo ou câmaras legislativas? “Não é por 0,20 centavos”, lia-se em muitos cartazes. Por certo, o aumento das passagens do transporte coletivo urbano foi apenas a gota d’ água que fez transbordar a medida, que já andava cheia, mas não se percebia, nem se queria levar a sério o grau de insatisfação da Nação verde-amarela.
 
O povo, sobretudo os jovens, cansou-se de ouvir falar em corrupção, impunidade, falta de reforma política, povo que continua pobre na “5ª economia do mundo”... Quem disse que os jovens só querem navegar na “rede” e trocar mensagens cifradas, mantendo-se alienados da realidade que os cerca, estava bem equivocado. De um momento a outro, a indignação explodiu e se derramou de maneira ruidosa pelas ruas. Sem saber bem verbalizar a insatisfação que experimentam, adolescentes e jovens dizem, simplesmente: “não dá mais; temos que fazer alguma coisa; vamos mudar o Brasil”...
 
Mas nos cortejos das manifestações pacificas também apareceram os oportunistas nada pacíficos e pouco interessados em protestar, mas em extravasar em violência, ou em promover atos de vandalismo e depredação do patrimônio público e privado. Lamentavelmente, além dos danos materiais causados, esses anti-sociais também roubam a cena e ameaçam o caráter cívico das manifestações. Felizmente, houve uma clara repulsa desses atos por conta dos manifestantes.
 
O fenômeno dos protestos estendeu-se a todo Brasil, mesmo a cidades médias e pequenas. Não foi só pelo poder convocatório e contagiante das mídias sociais, mas pela vontade de mudar o Brasil para melhor. Como fazer? Ainda não se sabe bem como. Não se quis dar conotação partidária às manifestações, nem cunho institucional, mas estritamente popular: as massas querem falar; povo não identificável com partidos, ideologias, siglas e bandeiras, que acredita ser possível melhorar o Brasil, mas não se sente identificado com o andar das coisas, nem com discursos e estatísticas oficiais... Como vão conseguir isso? Ainda não se vê claro.
 
O certo é que o Brasil “real” está mostrando insatisfação com o Brasil “institucional”. Susto para os políticos! Barbas de molho para os que ainda achavam que o Gigante está “deitado eternamente em berço esplêndido!” Erro de cálculo para quem acha que estádios caros e suntuosos para a Copa do Mundo são a melhor política pública, porque enchem o povo de ufanismo campeão do mundo! O povo está cobrando um Brasil mais sério e justo para todos. Futebol, carnaval e internet já não bastam. Os jovens torcem por um presente de grandeza real para a Pátria amada idolatrada! Que sejam ouvidos.

Autor: Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo

Um comentário:

Anauri schäfer disse...

Caro Colega Proseador! Tem muita gente tirando muitas conclusões sobre estes protestos. Creio eu que existem, no mínimo, 3 tipos de conclusões usados por 3 grupos distintos de pessoas:
1º "Os protestos não passam de maquinações da direita rancorosa que quer desestabilizar o governo" (grupo governista, que está atualmente no poder: PT e demais partidos parasitas).
2º "Os protestos são consequência do desastre governamental de Lula e Dilma" (grupo das Elites Tradicionais, PSDB e Cia).
3º "Chega de corrupção, ineficiência e falta de representatividade e investimentos básicos!" (Grupo majoritário nos protestos, Povo em geral que exige uma nova ordem política).